segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

29/11/2014 13h52 - Atualizado em 29/11/2014 15h25


Dono do Galo, Dátolo renasce ao som da massa na Bombonera brasileira

Cérebro do campeão da Copa do Brasil reencontra futebol dos tempos de Boca, elogia atmosfera do Horto e se diz em casa: "Nunca imaginei ser amigo de brasileiro"

Por Cahê Mota e Thiago Correia

Belo Horizonte
Dátolo ressuscitou. Promessa do Boca Juniors campeão da Libertadores de 2007, o meia, que tem Jesus no nome, viveu anos de ostracismo. Negociado com o futebol europeu, decepcionou. As passagens por Napoli, Olimpiakos e Espanyol não deixaram saudade. No Internacional, o posto de craque do Gaúchão de 2012 virou ilusão para quem depois sequer flertou com o protagonismo. Até que surgiu o Galo. Surgiu o Horto. No Independência, o argentino se sente em casa, se vê na Bombonera, e desabrochou. De futebol refinado e postura firme - com boa dose de catimba -, assumiu o comando do meio-campo com a saída de Ronaldinho e termina 2014 como "dono" do campeão da Copa do Brasil.
Se Tardelli é o protagonista e Luan o xodó, Dátolo é quem faz o Galo jogar. Tudo passa por seus pés. Acelera o jogo usando a velocidade do trio ofensivo, cadencia quando necessário, e sorri. Sorri sempre que vê a massa ensandecida. O coadjuvante de Riquelme na última Libertadores conquistada pelo Boca voltou. E voltou porque reencontrou nas arquibancadas o grito que o fez despertar em Buenos Aires. Certo, Dátolo?
Encontrei aquele sentimento de entrar em campo e olhar para uma torcida maravilhosa como na época do Boca. Me sinto do mesmo jeito. Sou muito identificado, como era no Boca. Quando entro em campo, sinto uma emoção no coração. É a mesma sensação
Dátolo, meia do Atlético-MG
- Claro que sim! Joguei em vários clubes, mas no Atlético-MG encontrei aquele sentimento de entrar em campo e olhar para uma torcida maravilhosa como na época do Boca. Me sinto do mesmo jeito. Sou muito identificado, como era no Boca. Quando entro em campo, sinto uma emoção no coração. É a mesma sensação.
Indicado por Cuca, o meia demorou a engrenar também em Belo Horizonte. Com Paulo Autuori, foi improvisado de lateral-esquerdo, até que renasceu para o futebol sob o comando de Levir Culpi. Com Luan, forma a dupla mais carismática do campeão da Copa do Brasil. Parceria que surpreende até mesmo o argentino:
- Nunca imaginei que iria ser amigo de um brasileiro (risos). Aconteceu. Nos gostamos bastante, sem nada em troca. Isso que é importante, amizade pura.
De mate e cuia na mão, Dátolo recebeu o GloboEsporte.com na área de lazer de seu apartamento em BH. Feliz da vida, dissecou o bom momento que vive dentro de campo e falou também da relação com o Brasil. Em pingue-pongue, revelou preferências, mas não quis se comprometer em um assunto: Maradona ou Pelé? Confira abaixo:
Campeão, um dos destaques do time, em alta no Brasil... Vou aproveitar o gancho da Copa do Mundo, quando a Argentina ficou em BH, para te perguntar: decime que se siente?
Ritual de toda manhã: Dátolo acorda e prepara o tradicional mate argentino (Foto: Cahê Mota)
- (Risos) Feliz, muito feliz. Estou contente com a Copa que tanto queríamos. As pessoas daqui comemoraram muito por ter sido a primeira vez que o Galo conseguiu ganhar. Foi muito bom.
Você despontou muito bem no Boca, mas depois nunca mais conseguiu repetir aquela performance. Fosse na Europa ou até mesmo no Inter, teve dificuldade de engrenar. O que mudou para que jogasse tanto como no Galo?
- Quando vim jogar no Inter, os primeiros seis meses foram muito bons. Depois, tive má sorte. Machuquei muito, não tive sequência de jogos e baixei o nível. Aqui no Galo, foi a mesma coisa. Não conseguia acertar. Com a chegada do Paulo Autuori, pude jogar. Mesmo que fosse de lateral-esquerdo, fora da minha posição, tive sequência, ganhei confiança. Com a chegada do Levir, pude ter oportunidade na minha posição, o que favorece muito. Hoje em dia, estou bem, na minha. A confiança do treinador é muito importante para um jogador.
Houve dificuldade de adaptação ao país? Foi algo que te prejudicou também?
- Não tive muita dificuldade. O brasileiro só tem a briga com o argentino no futebol, o que é normal, mas na rua dou os parabéns. Na rua e nos estádios, sempre fui muito bem recebido em todo Brasil. Estou muito feliz aqui, represento meu país. É muito difícil um argentino chegar aqui e jogar bola. Dou os parabéns aos brasileiros, eles me tratam muito bem.
Depois do título pelo Boca, em 2007, você rodou na Europa e não conseguiu se encontrar. Há explicação para essa queda de rendimento?
Jogo mais com a experiência. Não tanto com a velocidade da época do Boca, mas um pouco mais maduro fisicamente e mentalmente. Isso me fez crescer muito.

Dátolo
- Já com meus 30 anos, jogo mais com a experiência. Não tanto com a velocidade da época do Boca, mas um pouco mais maduro fisicamente e mentalmente. Isso me fez crescer muito. Me sinto muito bem. O jogador sul-americano sente a carência na Europa. Aconteceu isso comigo, não me senti à vontade. Quando fui para o Napoli, o clube brigava para não cair. Agora, está muito forte, com grandes jogadores, bem diferente de quando eu fui. Saí do Boca ganhando títulos e passei a brigar para não cair. Não tive sorte neste sentido.
Você diria que hoje está próximo do auge que viveu no Boca?
- Acho que sim. Eu me sinto um jogador um pouco mais completo até. Antes, eu corria mais, jogava pelo lado esquerdo do campo. Hoje, jogo mais de meia. Mudei essa característica. O meu jogo mudou, sou um pouco mais versátil. Minha visão de jogo está muito melhor, o que me fez crescer como jogador.
O Brasil tem vivido uma carência muito grande de jogadores na sua posição. Há um bom tempo, os destaques são argentinos: Montillo, Conca, D'Alessandro... Por que é tão fácil encontrar meias-armadores na Argentina?
- A característica dos times argentinos é essa, de ter o enganche, o meia, como vocês falam. Aqui no Brasil, não jogam muito assim. Cada time tem sempre um camisa 10, é uma questão de cultura, característica.
Você foge um pouco do meia clássico, que cadencia o jogo e busca espaços para meter bola, é um cara que conduz, acelera o jogo... O Dí Maria foi quem mais deu assistências na última temporada europeia. É um cara que te inspira?
- Temos que observar os jogadores e absorver coisas boas. Gosto de acompanhar futebol de todos os países. É sempre bom aprender os movimentos de cada jogador. O atleta tem que fazer isso. Vivemos disso.
O ataque do Galo é muito rápido, com Tardelli, Luan e Carlos. Isso facilita o seu trabalho, até para lançar no espaço vazio? Há algum tipo de conversa antes dos jogos para combinar esse tipo de coisa?
- Facilita muito as coisas. Tardelli, Luan, Carlos, Dodô, Paulinho, são todos muito rápidos. É muito mais fácil enfiar a bola, porque eles vão chegar. É muito bom para o meia.
Pela relação criada com o Independência, a atmosfera, tudo que aconteceu nos últimos anos, o Atlético-MG atual se assemelha com o Boca Juniors do início do século, que colocava medo na Bombonera?
- O Galo é um clube muito respeitado no Brasil hoje em dia. Isso que pretendíamos. É uma característica do clube. O jogador que vem já chega sabendo o que é o Galo. Nas ruas, o torcedor mostra o quanto é grande. O Atlético-MG está em um bom caminho, conseguimos esse respeito.
O Horto tem algum tipo de semelhança com a Bombonera?
Tem momento que temos que parar, outros correr, tem momento para tudo. Futebol é 100% mental. É preciso pensar em quando correr, falar e parar. O jogador precisa entender isso. Nem tudo é correr
Dátolo, meia do Atlético-MG
- Claro que sim! Joguei em vários clubes, mas no Atlético-MG encontrei aquele sentimento de entrar em campo e olhar para uma torcida maravilhosa como na época do Boca. Eu me sinto do mesmo jeito. Sou muito identificado, como era no Boca. Quando entro em campo, sinto uma emoção no coração. É a mesma sensação.
Todos sabem da sua amizade com o Luan. Como nasceu essa relação? Ele brinca dizendo que é maluco, você já parece ser mais sereno fora de campo...
- É por isso que somos muito amigos. Ele é um cara que está sempre acelerado, eu sou mais tranquilo, tento segurá-lo. Nós nos damos muito bem. Também sou muito amigo do Emerson (zagueiro). É muito importante para mim vir ao Brasil e fazer esse tipo de amizade. Nunca imaginei que ia ser amigo de um brasileiro (risos). Aconteceu. Nós nos gostamos bastante, sem nada em troca. Isso que é importante, amizade pura.
Você já tem 30 anos. O que planeja para carreira? Sonha com um retorno para a Europa ou a Europa do jogador sul-americano hoje é o Brasil?
- Minha vida está aqui no Brasil, em Minas Gerais. Sou muito feliz. O dia de amanhã eu não posso saber, mas sou muito feliz no Atlético-MG. Não me vejo jogando em outro time. O futebol, obviamente, muda muito, mas me sinto muito bem. Se eu pensar em voltar para a Europa, meu foco muda de sentido. Estou focado em continuar no Galo, ganhar muitos títulos, e depois o destino nunca se sabe. Minha prioridade é o Galo.
Sua história na seleção da Argentina é curta, mas muito intensa. Fez gol na estreia, fez gol no Brasil... Ainda é possível voltar?
- Sempre! Sempre vou ter em mente. Trabalho para isso, me esforço para ter uma chance. Até agora, não chegou, mas todo jogador quer uma chance de vestir a camisa de seu país. Tenho que trabalhar muito para conseguir isso.
Mesmo tranquilo fora de campo, você é um cara que fala bastante durante os jogos, catimba, conversa muito com a arbitragem... É algo natural do argentino ou tem como aprender isso de conduzir o jogo também com palavras?
- Isso vem com a experiência. São 12 anos como jogador profissional. Tem momento que temos que parar, outros correr, tem momento para tudo. Futebol é 100% mental. É preciso pensar em quando correr, falar e parar. O jogador precisa entender isso. Nem tudo é correr.
Para fechar, vamos fazer um pingue-pongue a respeito de Brasil e Argentina. Fale de sua preferência...
Pampulha ou Obelisco?
Pingue-pongue: Dátolo aponta suas preferências entre brasileiros e argentinos
- Obelisco, sou argentino.
Galo ou Galinha (River Plate)?
- Galo!
Luan ou Martín Palermo?
- Os dois.
Horto ou Bombonera?
- La Bombonera.
Cumbia ou Pagode?
- Cumbia.
Dilma ou Cristina Kirchner?
- Nenhuma das duas.
Fernet ou Caipirinha?
- Fernet.
Roman Riquelme ou Ronaldinho?
- Ronaldo.
Jesus (Dátolo) ou D10S (Maradona)?
- D10S sempre!
Pelé ou Maradona?
- São diferentes. Cada um fez seu futebol em seu momento, em sua época. São dois grandes ídolos!
Brasil ou Argentina?
- Argentina!

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