quarta-feira, 24 de março de 2010

Há coisas que só acontecem com o Galo! (24/03)

Eugênio Moreira - Estado de Minas

Nos últimos anos, o Botafogo tem sido adversário difícil para o Atlético. Mas foi em 1958 que uma derrota para o time da Estrela Solitária provocou uma crise no clube mineiro. Na verdade, não foi uma simples derrota. Em amistoso no Independência, em 23 de março, o Galo, que comemorava seu cinquentenário, venceu o primeiro tempo por 4 a 0, mas permitiu no segundo a virada botafoguense. “O Atlético marcou 4 x 0, mas acabou vencido” foi a manchete de Esportes do Estado de Minas. “Explorando as falhas do rival, o Botafogo triunfou por 5 x 4.” A equipe comandada pelo técnico Newton Annet acumulava uma série de tropeços no início da temporada: havia perdido oito dos 11 primeiros jogos no ano, os dois últimos para o argentino Racing, por 3 a 2 e 2 a 1, na semana anterior. A derrota de virada para o alvinegro carioca foi a gota d’água para uma série de protestos, a começar pelo próprio EM. “As circunstâncias em que se verificou o insucesso atleticano constituem agravantes que não podem ser disfarçadas”, dizia o texto sobre o jogo. “Poder-se-á argumentar que tal ato é próprio da natureza caprichosa do futebol, mas, em contraposição, há que se considerar que talvez não haja na história do Atlético registro semelhante. De fato, a transformação do prenúncio de uma façanha espetacular em surpreendente e melancólica derrota, que se adiciona a uma longa série de fracassos, não pode ser encarada como fato normal na vida do glorioso clube mineiro.” O Galo tomou conta da partida no início, pressionando o Botafogo em seu campo defensivo, com destaque para a atuação do armador Alvinho, responsável pela criação das jogadas ofensivas, com arrancadas sensacionais. Em poucos minutos, o time da casa já havia obtido vários escanteios. Num deles, Tomazinho fez o primeiro gol, de cabeça. A equipe visitante não se abateu e explorava a velocidade de Garrincha, que superava facilmente a marcação de Nilsinho. Nílton Santos também se destacava, com boas finalizações contra o gol de Mussula – emprestado pelo Villa Nova somente para o amistoso, devido às dificuldades atleticanas em conseguir um bom goleiro; ele voltaria a defender o clube entre 1968 e 1973. A partir do segundo gol (Alvinho, de falta), o Galo cresceu e o adversário se abateu. Alvinho fez mais dois antes do intervalo e o jogo parecia liquidado. No segundo tempo, porém, o Botafogo, dirigido por João Saldanha, passou a explorar os pontos fracos dos mineiros, principalmente no meio-campo e na lateral esquerda, onde Nilsinho raramente conseguia parar as investidas de Garrincha, que deu o passe para o gol de Édison e fez ele próprio o segundo. O time botafoguense, campeão carioca de 1957, já tomava conta do jogo, enquanto o Atlético não conseguia repetir as jogadas do primeiro tempo. O terceiro gol saiu de uma cobrança de falta em que todos esperavam a folha seca de Didi e Paulinho Valentim surpreendeu com chute forte, sem chances para Mussula. Quarentinha, maior artilheiro da história do clube (313 gols), empatou e virou o placar. CRISE INEVITÁVEL Para piorar o ambiente no Atlético, a diretoria anunciou no dia seguinte, segunda-feira, a venda do atacante Tomazinho ao Palmeiras. O Estado de Minas, em 25 de março (dia do 50º aniversário do clube mineiro), publicou artigo com o título Reter Tomazinho e dispensar o técnico. O texto afirmava que “a velha guarda atleticana” se mostrava preocupada não só com as seguidas derrotas, mas também com “um desgaste muito mais sério, o da flama atleticana”. “O Atlético está caindo quase de joelho diante do adversário, como se fosse um quadro sem tradição, sem elã, sem calor.” De acordo com o artigo, “os velhos e ardorosos adeptos do Atlético” colocavam a culpa no jovem técnico Newton Annet, descrito como “um moço de altas virtudes de espírito e de caráter, mas inteiramente neófito em futebol, que se tem mostrado incapaz para o posto que ocupa. Trata-se de um moço fino, de boa cultura esportiva, adquirida nos livros, mas não na prática do futebol, que tem as suas manhas, os seus segredos, que os compêndios não revelam”. Apesar da pressão e de mais uma derrota na partida seguinte (3 a 2 para o Palmeiras, no dia 26), Annet não foi demitido imediatamente e, quatro dias depois, empatou um clássico amistoso com o Cruzeiro por 2 a 2.

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